terça-feira, 24 de agosto de 2010

Estupradores em liberdade

Maria José Miranda Pereira
Promotora de Justiça do Tribunal do Júri de Brasília

O estupro de criancinhas, a pedofilia, é o crime da moda, com frequência assustadora. Os estupros são os crimes mais bárbaros e repulsivos. Estupradores não forçam somente uma relação sexual normal. Costumam praticar toda sorte de perversão, sexo anal, seguido de sexo oral e outros atos libidinosos cruéis. Muitos ainda torturam as vítimas, enfiando objetos nas suas cavidades naturais. As sequelas são terríveis e de difícil cura. É, pois, natural se esperar que os criminosos sexuais sejam severamente punidos. Não são. Somos, culturalmente, uma nação que privilegia os criminosos, necessariamente, em detrimento das pessoas de bem.
O sistema jurídico brasileiro estabelece penas absurdamente suaves para o estupro. Como impera a cultura da pena mínima, raramente se condena um estuprador a mais de sete anos. Já seria muito pouco se ele tivesse de cumprir toda a pena, mas a lei de execuções penais permite cumprir só pequenina parcela dessa pena minúscula, numa completa desproporção com a extrema brutalidade do crime. Vidas dilaceradas costumam custar ao estuprador cerca de míseros dois anos de prisão. São muitos os Josés Admares e Adayltons, de triste notariedade. Nem todos tiram as vidas, mas todos matam a alma, a dignidade sexual, a saúde emocional de suas vítimas.

Os criminosos sexuais, geralmente, não são doentes mentais, não rasgam dinheiro, não fazem mal a eles próprios e têm perfeito discernimento do que é certo ou errado. Têm índole cruel, personalidade distorcida, caráter pervertido. Quando soltos, costumam reincidir na prática do nefando crime. Deveriam, pois, ficar segregados da sociedade por maior tempo.

A impunidade se acentuou absurdamente com a interpretação judicial da Lei nº 12.015/2009, que foi criada com o objetivo oposto, qual seja, o de repressão mais rigorosa dos crimes sexuais. Antes, o Código Penal previa um crime de estupro (artigo 213), quando o criminoso forçava a vítima à conjunção carnal, e outro de atentado violento ao pudor (artigo 214), quando ele praticava também sexo anal, oral e outras barbáries. As penas de cada crime eram somadas. A nova lei, de péssima técnica legislativa, juntou os dois crimes num só artigo. A única interpretação lógica e justa, e que atende aos fins pretendidos, é a de que os crimes só mudaram de endereço, mas continuam distintos e se deve continuar a somar as penas. É o chamado tipo misto cumulativo, conforme entendimento de alguns cultos magistrados, como os doutos ministros do STJ, Felix Fisher e Laurita Vaz, o ilustre juiz Fernando Barbagalo, o desembargador Luiz Gustavo Oliveira, o grande doutrinador Vicente Greco Filho e muitos outros profissionais de inegável saber jurídico.

Muitíssimo, lamentavelmente, diverso é o entendimento do tribunal local e de muitos magistrados que o seguem. Condenam por um só crime, mesmo quando o estuprador pratica vários atos sexuais perversos, além da conjunção carnal. Alegam que a lei atual é mais benéfica, razão por que fazem-na retroagir para beneficiar os anteriormente condenados pelos dois crimes. De regra estão excluindo a metade da pena, ensejando a liberdade de grande quantidade de estupradores e pedófilos. Uma verdadeira festa para os advogados dos criminosos e uma tragédia para as vítimas e a sociedade!

Essa interpretação de crime único é inconstitucional pelo princípio da proibição da proteção deficiente, um princípio moderno, de aplicação recente no Brasil, o qual, de forma singela, se tenta explicar: A Constituição protege o criminoso dos excessos e abusos dos órgãos de repressão do Estado. É o nominado princípio da proibição dos excessos, corolário do princípio da proporcionalidade. Em termos mais leigos, há que se respeitar a proporção entre a gravidade do crime e o tamanho da pena. Assim, não se pode punir o estuprador extrapolando os limites da previsão legal. Muito se tem invocado o Garantismo, um princípio constitucional que garante os direitos fundamentais do criminoso.

Ocorre que não se deve somente garantir que não haja excessos do Estado contra o cidadão, mas garantir igualmente que não haja omissão do Estado, que não haja proteção insuficiente dos direitos fundamentais. A vítima, e de resto toda a sociedade, tem o direito de que o Estado puna suficientemente o praticante de crimes. Se o Estado, por intermédio do Poder Judiciário, ao interpretar a lei dos crimes contra a dignidade sexual, está punindo os estupradores de forma absolutamente insuficiente, essa interpretação é inconstitucional pelo princípio da proibição da proteção deficiente. A interpretação de que a nova lei beneficia o estuprador não está condizente com a Constituição, pois não pode o Poder Judiciário diminuir a proteção aos direitos fundamentais, notadamente o direito à dignidade sexual. Rezemos para que Deus inspire as decisões dos juízes.

Artigo publicado no jornal Correio Braziliense, edição de 21 de agosto de 2010

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Jovens de gangue de Samambaia são condenados a 159 anos de prisão

Na madrugada de hoje, por maioria absoluta, o Tribunal do Júri decidiu que Lauiço Santos e Michael Silva cumprirão, respectivamente, 84 e 75 anos de reclusão pela execução do estudante Mardiney Lopes e pela tentativa de homicídio contra outros seis jovens

Por volta das 4h da madrugada de hoje (20/8), o Tribunal do Júri de Samambaia condenou, por maioria absoluta, Lauiço de Brito Santos e Michael da Mata Silva, respectivamente, a 84 e 75 anos de reclusão inicialmente, em regime fechado. Eles, com outros dois comparsas, integravam a gangue que, em 6 de julho de 2009, executou com dois tiros na cabeça o estudante Mardiney de Carvalho Lopes, na Quara 6 da QR 403 daquela cidade. O grupo feriu à bala Allan Araújo Freire e Aldo Andrelino Júnior e ainda tentou matar Marcelo Domingos de Santana, Washington Almeida Silva, Leonardo Félix de Sousa Silva e Rafael de Jesus Fernandes.

Ao anunciar a decisão, a juíza Gilsara Cardoso Barbosa Furtado, titular do Tribunal do Júri de Samambaia, lembrou que os réus têm graves antecedentes criminais, entre eles por roubo e por homicídio. Lauiço Santos, já condenado por roubo, deverá voltar ao banco dos réus, acusado de participação em mais um assassinato. A Justiça ainda julgará Felipe Gonçalves Dias e Valdeir Alves Brito, integrantes da gangue. Felipe será julgado em separado. Valdeir está foragido.

O julgamento durou mais de 20 horas e está entre os mais longos da história do Tribunal do Júri de Samambaia. A sentença aplicada aos réus foi considerada exemplar e prova que a sociedade local repele totalmente a ação de gangues e a violência. À frente da acusação estavam os promotores Paulo Vinícius de Almeida e Ronny Alves de Jesus, além das advogadas Iara Lobo e Francisca Clotilde Costa Pimenta, da assessoria jurídica da Subsecretaria de Proteção às Vítimas de Violência (Pró-Vítima), órgão da Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania (Sejus), que atuaram como assistente de acusação.

A subsecretária da Pró-Vítima, Valéria de Velasco, afirmou que o resultado do julgamento “é importante para que os familiares das vítimas possam retomar suas vidas, acreditar na Justiça e para que o país possa vencer a epidemia da violência”. Para ela, a condenação dos réus é mais um passo importante para conter a impunidade, uma grande aliada da violência. Valéria de Velasco disse ainda que a população de Samambaia, representada pelo conselho de jurados e pelos promotores de Justiça, “mostrou que não quer esse caminho e busca uma sociedade sem violência”.

“Não vou ter meu filho nunca mais. Mas graças a Deus e ao trabalho do Pró-Vítima ficou provado que Mardiney não era um menino de gangue e o resultado do julgamento impediu que a impunidade prevalecesse”, afirmou Francinilva Carvalho Lopes, 47 anos, mãe do jovem executado.

O CRIME
Por volta de 1h10, de 6 de julho de 2009, Lauiço de Brito Santos, Valdeir Alves de Brito, Felipe Gonçalves Dias e Michael da Mata e Silva, armados de revólveres, abordaram Mardiney de Carvalho Lopes, Allan Araújo Freire, Aldo Andrelino Júnior, Marcelo Domingos de Santana, Washington Almeida Silva, Leonardo Félix de Sousa Silva e Rafael de Jesus Fernandes que conversavam na Rua 6 da QR 403, em Samambaia. Os integrantes da gangue mandaram que todos se deitassem no chão e indagaram: "Vocês é que gostam de matar o pessoal da QR 603?". Em seguida, começaram a chutar e dar coronhadas nas vítimas. Exceto Mardiney, todos os outros jovens correram e escaparam da execução. Allan e Aldo foram feridos na perna. Mas Mardiney permaneceu deitado e não foi poupado pelos agressores, que dispararam dois tiros em sua cabeça. O jovem de 18 anos, a duas semanas de concluir o segundo grau e que trabalhava no Supermercado Atacadão, em Taguatinga, morreu na hora, sem qualquer chance de defesa. Os assassinos, em depoimento à polícia, confessaram que não conheciam Mardiney. Para o Ministério Público, "os crimes foram cometidos por motivo torpe, pois os denunciados pensavam que as vítimas eram residentes na QR 403, quadra que consideravam rival, e que por essa razão mereciam morrer".

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Superação pela solidariedade

Nesta terça-feira (17/8), das 13h30 às 15h, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) promove a mesa redonda "Fique por dentro - Superação pela solidariedade - do luto à luta". Serão palestrantes Valéria de Velasco, subsecretária de Proteção às Vítimas de Violência, da Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania; Bete Davison, da organização não governamental Rodas da Paz; e Cristina Del'Isola, do Movimento Maria Cláudia pela Paz. As três têm em comum a perda de um familiar por meio violento.
No encontro com servidores, estagiários e terceirizados do TST, as palestrantes falarão sobre as experiências pessoais como familiares de vítimas da violência, a retomada do equilíbrio e a transformação do luto em luta contra a impunidade e pelo fim da violência.

Serviço:
Evento: Mesa redonda — Superação pela solidariedade – do luto à luta
Local: Auditório do 1º andar do Bloco B do TST
Horário: das 13h30 às 15h

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Nota de falecimento

É com profundo pesar que a Subsecretaria de Proteção às Vítimas de Violência (Pró-Vítima) informa a morte de Saturnino Luiz da Silva, 74 anos, pai da colega Maria Derminda da Silva Pereira (Dedé), ocorrida na madrugada desta quarta-feira. O velório, das 14h às15h, será na capela 9, do Cemitério Campo da Esperança, de onde o corpo seguirá para Minas Gerais, onde será sepultado.